O conjunto "autor-obra" à luz de Dalton Trevisan...

Embora a Obra esteja profundamente interligada à ideologia de seu Autor, termo que no contexto de Frankfurt se limitava às concepções marxistas do conceito, e hoje amplia-se à subjetividade, quase que inconsciente, do ser, há um debate riquíssimo, e que não deveria ser diminuído à bel moralidade ocidental do século XXI. As diferenciações entre Obra e Autor, ou melhor, tal discussão, atravessa os séculos e, a depender do contexto histórico em que esse debate é elucidado, sempre chegam-se a um consenso provisório. 

Hoje, talvez seja fartura de imagem. Assim como as máscaras mortuárias de um indivíduo desprovido de identidade fora de seu contexto no espaço-tempo, a imagem de um Autor resvala, a princípio, de um discurso, à la vendas, semelhante a essência de si próprio. Hoje, talvez seja imprescindível o conjunto autor-obra. Mas, para além deste paradigma, cujo remete ao marketing de si mesmo, talvez valha a pena destacar o causo de Dalton Trevisan.  


Conheci Dalton através de uma coluna de despedida, in memorian, da revista “Quatro cinco um”, na qual despediam-se do autor falecido em 2024. A figura do Vampiro de Curitiba passou a compor meu imaginário. Principalmente quando li, noutra ocasião, uma rara entrevista concedida ao jornal Estadão.


Ocorrida em 1972, concedida ao jornalista Mussa José Assis (1944-2013), Dalton Trevisan contrapõe que “[...]o conto é sempre maior que o contista[...]”. Ele não era tão acessível, levando a alcunha de Vampiro, à preferência de reservar sua privacidade, além de acometer à entrevista algumas tiradas que podem confundir, enganar e caçoar até, os leitores despercebidos, como por exemplo: 


“O escritor é um ser maldito. O escritor é uma pessoa que não merece confiança. Um amigo chega e me conta as maiores dores: eu escuto com atenção, mas estou é recolhendo material para mais um conto. E eu sei disso na hora.”


O que está sendo enrolado a dizer aqui é sobre a efemeridade do Autor, perecível ao tempo, à moralidade, aos valores de sua época que, noutro contexto, pode tornar-se maleável a partir da concessão de um ethos temporal. Entretanto, sua Obra, no decorrer de causos e causos, não. Ela, talvez, transcenda as barreiras ilusórias de um ser findado. Transcende, talvez, a moral, por um ato embebido da natureza fluida de sua ética… Transcenda talvez, também, barreiras fisiológicas, como língua, linguagem, e outros fatores sintéticos. Talvez, justamente pela sua essência transformadora. Contudo, este ponto pode ser um tema para um futuro mini-ensaio

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